quarta-feira, 22 de junho de 2016

Gesto e improvisação em dança, mergulho na medialidade

Loïe Fuller, Danse Serpentine.
Finalizando a apresentação que farei em um Colóquio sobre o gesto (http://isgs7.sciencesconf.org/) no próximo mês, cheguei a um ponto de reflexão que me parece potente. O texto tenta relacionar, através de um argumento simples, duas concepções filosóficas bastante complexas: o gesto em Agamben e a Improvisação em Dança em Michel Bernard. Uma afirmação que, por hora, me parece possível é a de que ambos operam entre a potência e o ato. Depois de um longo caminho conceitual para desenvolver e buscar diálogo entre as ideias dos dois filósofos percebi que pode haver entrelaçamento do assunto ao caminho epistemológico do corpodispositivo, quer seja:


"Compreendemos que em seu jogo espaço-sensorial o que a improvisação dançada opera é uma desdobra do “ser em meio a”, ou seja, ela rege e desvela, ainda que parcialmente, uma espécie de orquestração do gesto que diz respeito às maneiras provisórias de arranjo do corpo e, ao mesmo tempo, ao seu inevitável pertencimento ao meio. Enquanto o gesto aponta para o “ser em meio a”, a improvisação procura apreendê-lo, em algum aspecto, para que ele possa ser exibido pelo próprio movimento gestual. Sendo assim, podemos, ao menos por hora, concluir que a improvisação em dança propõe e provoca um mergulho na medialidade, uma captura de devires que se irrompe em gestos sem fim." (trecho da apresentação ainda não publicada) 

Para que se dê esse tipo de relação entre dança e gesto é necessário pensar um corpo em atravessamento, assim como Bernard propõe em sua noção de corporeidade. Mas, enfim, isso é apenas um novo ponto de partida que pode ou não fazer parte desta pesquisa. Veremos...

Aos que se interessarem, segue referência consultada:

  • ANDRADE, Graziela.Corpografia em dança: da experiência do corpo sensível entre a informação e a gestualidade. Tese (doutorado) – Universidade Federal de Minas Gerais, Escolade Ciência da Informação, 2013
  • AGAMBEM, Giorgio. Notes sur le geste. Tradução Daniel Loayza. In: Trafic 1. Paris: POL, 1992, p. 49-52.
  • AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo? E outros ensaios. Tradução Vinícius Nicastro Honesko. Chapecó: Argos, 2009.
  • AGAMBEM, Giorgio. Le geste et la danse. In: MACEL, Christine; LAVIGNE, Emma (Org.). Danser sa vie: écrits sur la danse. Paris: Éditions du Centre Pompidou, 2011, p. 189-194.
  • BERNARD, Michel. Du “bon” usage de l´improvisation en danse ou du mythe à l´experience. In: BOISSIÈRE, Anne; KINTZLER, Catherine. (Orgs). Approche philosophique du geste dansé: de l´improvisation à la performance. Villeneuve D'Ascq: Presse Universitaire du Sedpentrion, 2006.
  • BERNARD, Michel. Le corps. Paris: Éditions du Seuil, 1995.
  • BERNARD, Michel. L´Altérité Originaire ou les mirages fondateurs de l´indentité. Revue Protée: danse et altérité, v.29, n. 2, 2001, p. 7-24. Disponível em: <http://www.erudit.org/revue/pr/2001/v29/n2/030622ar.html>. Acesso em: 10 maio 2013.



segunda-feira, 9 de maio de 2016

O corpo: eis minha questão

Parodiando Santo Agostinho* perguntaríamos:
Quem sou? – És um corpo, seja isso o que for.

Questionar esse enigma chamado corpo é se dar conta de uma experiência radical. Assim como a filósofa brasileira Marilena Chaui, entende a reflexão filosófica como o movimento de volta do pensamento sobre si mesmo para conhecer-se a si mesmo, todo sujeito que pensa um corpo, também o é. O corpo é onde ser e ter são insolúveis. Insolúvel em ordem primeira do que não se disjunta, pois que é preciso se ter corpo para sê-lo e é impossível se ser corpo sem tê-lo. Insolúvel, por outro lado, porque corpo parece querela sem solução. São corpos pensantes esses que se propõem a pensar os próprios corpos. Há uma unidade intransponível entre o pensamento e o corpo - que é quem pensa e sobre quem se pensa. O corpo que temos é o que somos e dele emerge o pensamento sobre ele mesmo. Nesse sentido, radicalizar as reflexões sobre o corpo é nos fazer lembrar que é também um corpo, esse que o pensa.

O legado filosófico nos promete assim a indissociação entre corpo e sujeito e diante disso, inquietam-me nossas relações com as coisas do mundo, no entendimento mais ampliado dessas coisas, enquanto aquilo que não somos nós, que não é corpo, mas com as quais nos movemos, nos misturamos, nos envolvemos de maneira efetivamente complexa. Somos seres moventes, em movimento e implicados em um mundo de movimentações. Tudo está em fluxo. Em verdade, é melhor levantarmos uma imagem mais totalizadora, pois, não é possível pensar em um ser fora do mundo, de tal sorte, somos apenas mais uma parte do mundo - aqui entendido como um todo - e temos no corpo nossa representação nesse sistema totalizante. Somos corpo do mundo, pois a ele pertencemos. E somos corpo no mundo, pois nele agimos. E de que forma os movimentos do mundo se enredam aos nossos movimentos no mundo?

O corpo contemporâneo, movendo-se diante da compressão espaço-temporal das tecnologias digitais: Eis minha inquietação!

*Hannah Arendt (2001) ao citar Agostinho como o primeiro a levantar a questão antropológica na filosofia, mostrar que ele estabeleceu uma diferença entre as perguntas “Quem sou?” e “O que sou?”, a primeira dirigir-se-ia ao homem e a segunda a Deus. Como afirma a autora: Em resumo, a resposta à pergunta “Quem sou?” é simplesmente:”És um homem – seja isso o que for” e a resposta à pergunta “O que sou?” só pode ser dada por Deus que fez o homem. (p.19)


sexta-feira, 6 de maio de 2016

Epistemologia em questão

Pesquisa tem hora que parece ganhar vida própria. Você projeta algo, segue os primeiros passos, mas o rumo muda entre leituras. Pensar o corpodispositivo, atualmente, tem me parecido pesquisa pra vida toda. Talvez neste momento o mergulho seja na epistemologia, reflexão urgente para a dança, aliás. Este já seria um longo caminho. Estou prestes a aceitar este convite: 

"O argumento básico desse convite é a certeza de que a monnstrificação de certos assuntos (como a epistemologia, por exemplo) necessita ser desmanchada pelos que se interessam em resgatar a dança do puxadinho das artes cênicas no qual ela ainda se encontra confinada. Precisamos da epistemologia porque, como se sabe, a dança é dependente de um fazer e será necessário defender a experiência como apta a produzir conhecimento – o que não é tão simples quanto parece a quem não tem familiaridade com as discussões filosóficas sobre o conhecimento (Katz, 2012, p.96)."  

A noção de corpodispositivo pode ser isso em princípio, uma contribuição para a reflexão epistemológica da Dança enquanto campo de conhecimento. Esta ideia tem ganhado permanência nesta pesquisa. Veremos.



segunda-feira, 25 de abril de 2016

Linguagem

Persiste a ilusão de inteireza do corpo, talvez associada a uma animalidade ancestral. Teria o corpo um dia sido um? Duvido bem disso. Agamben (2005) afirma que os dispositivos cá estão desde o princípio de nossa "hominização" e que um dos mais antigos deles seria a linguagem.
Pois bem, a linguagem. Eis um belo problema a partir do qual se pensar nossas fissuras. Vem dela nossas Tags. Assunto para se desenvolver. Linguagem que nos atravessa, rompe, marca, afeta, fratura.

sexta-feira, 22 de abril de 2016

Profanar

Ainda lendo Agamben (2005) começo a elaborar perguntas que auxiliam na reflexão do corpo enquanto dispositivo. Desconfio - algo que pode tornar-se hipótese de pesquisa -, de que o corpodispositivo é dividido em si mesmo, capturado por uns, pulverizado entre outros, o corpo é mais um dispositivo entre tantos. A profanação é o contradispositivo. Profanar é dessacralizar, devolver ao ordinário da vida o que um dia mudou de esfera.

quinta-feira, 31 de março de 2016

Políticas da dessubjetivação

Lendo uma conferência de Agamben (2005) me deparo com uma frase bastante oportuna para o momento do Brasil:

As sociedades contemporâneas se apresentam assim como corpos inertes atravessados por gigantescos processos de dessubjetivacãao que não correspondem a nenhuma subjetivação real. Daqui o eclipse da politica que pressupunha sujeitos e identidades reais (o movimento operário, a burguesia etc), e o triunfo da oikonomia, ou seja, de uma pura atividade de governo que não visa outra coisa que não a própria reprodução. Direita e esquerda, que se alternam hoje na gestão do poder, tem por isso bem pouco o que fazer com o contexto politico do qual os termos provém e dão nome simplesmente aos dois pólos - aquele que aposta sem escrúpulos sobre a dessubjetivação e aquele que gostaria ao invés de recobri-Ia com a mascara hipócrita do bom cidadão democrático - de uma mesma maquina governamental. (AGAMBEN, 2005, p.15)

AGAMBEN, G. O que é um dispositivo? Revista Outra Travessia. UFSC, Florianópolis, 2º semestre. Trad. Nilcéia Valdati.

terça-feira, 29 de março de 2016

Querela sem fim

Todo sujeito que pensa um corpo, também o é. O corpo é onde ser e ter são insolúveis. Insolúvel em ordem primeira do que não se disjunta, pois que é preciso se ter corpo para sê-lo e é impossível se ser corpo sem tê-lo. Insolúvel, por outro lado, porque o corpo parece querela sem solução.